A escola como conhecemos hoje não surgiu do nada e nem
tampouco para nada. A sua engrenagem, desde o seu início vem sendo montada com
objetivos muito claros para quem a concebeu e que servem somente aos interesses
de uma minoria branca, rica e patriarcal. Desde então tentam fazer com que a
escola seja natural a tal ponto que seja impensável a possibilidade de
questioná-la “Isto explica por que muitas críticas mais ou menos radicais à
instituição escolar são imediatamente identificadas com concepções quiméricas
que levam ao caos e ao irracionalismo.” (VARELLA, 1992, p.2).
Essa
escola começou a tomar forma quando a infância ganhou novas cores e nuances,
quando a mesma foi inventada, isso por volta do século XVI, por religiosos os
quais a definiram nada alheia aos interesses dos seus apostolados, procurando
doutrinar aqueles seres indefesos, maleáveis, fracos de juízo e rudes. Foi
então que a partir da definição de um estatuto da infância que se permitiu o
aparecimento da escola nacional. Contudo, a infância para as classes populares
não era pensada da mesma maneira que para as classes mais abastadas, assim,
desde seus primórdios, “A educação será um dos instrumentos chave utilizados
para naturalizar uma sociedade de classes ou estamentos” (página 4 maquinaria)
Desta
maneira, com uma sociedade que excluía as crianças das classes mais populares,
a partir do século XIX quando a escola começa a ser obrigatória, a história da
exclusão dentro da sociedade continua sendo reproduzida dentro dessa
instituição, com professores que menosprezavam “a cultura das classes humildes,
seus hábitos e costumes, desprezo reforçado e justificado pelos cursos da
Escola Normal” (p.14). Ao pensarmos então na ação pedagógica dentro desse
modelo de escola encontramos um “professor que não possui tanto saber, mas
técnicas de domesticação, métodos para condicionar e manter a ordem; não
transmite tanto conhecimento, mas uma moral adquirida em sua própria carne na
sua passagem pela Escola Normal” (VARELLA, 1992, p.14).
Essa
ação pedagógica que foi caracterizada anteriormente, está baseada no empirismo,
onde o professor fala e o aluno apenas executa, o professor é detentor do
saber, o conhecimento é apenas transmitido para o aluno, o qual é considerado
como uma tábula rasa,
Como se vê, esta pedagogia, legitimada pela
epistemologia empirista, configura o próprio quadro da reprodução da ideologia;
reprodução do autoritarismo, da coação, da heteronomia, da subserviência, do
silêncio, da morte da crítica, da criatividade, da curiosidade. Nessa sala de
aula, nada de novo acontece: velhas perguntas são respondidas com velhas
respostas. A certeza do futuro está na reprodução pura e simples do passado. A
disciplina escolar – que tantas vítimas já produziu – é exercida com todo
rigor, sem nenhum sentimento de culpa, pois há uma epistemologia, uma
psicologia (da qual não falamos aqui) e uma pedagogia que a legitimam. O aluno,
egresso dessa escola, será bem recebido no mercado de trabalho (BECKER, 1994, p.3).
Infelizmente,
essa pedagogia ainda ronda os corredores das nossas escolas e continua tornando
as nossas crianças marginalizadas, formando robôs prontos para apenas obedecer.
Como bem sabemos, essa intenção de colocar para funcionar uma engrenagem assim
serve somente aos interesses dos que detém o poder sócio-econômico-político, ou
seja, essa intenção, essa política é ideológica.
Contudo,
ainda assim é possível deslocar as peças dessa maquinaria, o que se torna
viável se além de vermos esse sistema e nos indignarmos com ele, enxergamos o
mesmo de fato, refletindo a respeito e fazer com que nossos alunos também
reflitam. Um caminho para isso é através de uma proposta construtivista, na
qual o professor acredita que o aluno construirá algum conhecimento novo se ele
agir e problematizar a sua ação, onde esse aluno não é visto como uma tábula
rasa, mas um amontoado de conhecimento prévio apto a fazer novas descobertas,
assim
O resultado dessa sala de aula é a construção e a
descoberta do novo, é a criação de uma atitude de busca, e de coragem que esta
busca exige. Esta sala de aula não reproduz o passado pelo passado, mas
debruça-se sobre o passado porque aí se encontra o embrião do futuro” (Becker, 1994, p. 12)
Assim
sendo, somente a partir de uma sala de aula onde se garanta um espaço baseado
numa relação horizontal entre professor e aluno, onde haja parceria e diálogo
como o próprio Freire (1991) nos diz que é nele que se “enfatiza a reflexão, a
investigação crítica, a análise, a interpretação e a reorganização do
conhecimento”, onde o professor é mediador das relações interpessoais e
facilitador do descobrimento, que se pode construir uma escola efetivamente
democrática,
O que mais precisamos fazer é nos munir
de argumentos, de olhares críticos sobre o que está posto, precisamos burlar o
sistema, ir além dele, jogar luz nas nossas salas de aula e enchê-las de
questionamentos, de criticidade, de desafios, enchê-las de conhecimento, mas
principalmente de alunos pensantes, formar cidadãos reflexivos a tal ponto de
não reproduzirem um sistema falido que
exclui, que enxota, que é desigual e injusto. Que a diferença comece por aquele
projeto do qual os alunos sempre vão se lembrar que participaram na sua aula,
daquela atividade simples em que colocaram o corpo em movimento, daquela troca
gostosa, daquele olho no olho.